"Sobretudo, não acredite nos seus amigos, quando lhe pedirem que seja sincero para com eles. Esperam somente que os mantenha na boa ideia que fazem de si próprios, fornecendo-lhes uma certeza suplementar que extrairão da sua promessa de sinceridade.
Como é que a sinceridade poderá ser uma condição da amizade?
O gosto da verdade a todo o custo é uma paixão que nada poupa e a que nada resiste. É um vício, por vezes um conforto, ou um egoísmo.
Se, pois, se encontra neste caso, não hesite: prometa ser verdadeiro e minta o melhor que puder. Corresponderá ao profundo desejo deles e provar-lhes-á duplamente a sua afeição.Tanto isto é verdade que raramente nos abrimos com os que são melhores do que nós.
Evitaríamos de preferência o seu convívio.
A maior parte das vezes, pelo contrário, confessamo-nos aos que se parecem connosco e que partilham das nossas fraquezas.
Não desejamos, pois, corrigir-nos, nem tornar-nos melhores: seria preciso, antes de tudo, que fôssemos considerados fracos.
Desejamos apenas ser lastimados e encorajados no nosso caminho. Em suma, desejaríamos, ao mesmo tempo, deixar de ser culpados e não fazer esforços para nos purificarmos.
Nem muito cinismo, nem muita virtude. Nem para o mal, nem para o bem temos energia.
excerto de «A Queda», Albert Camus
Nenhum comentário:
Postar um comentário